Prefeituras querem cobrar IPTU de aeroportos

Prefeituras querem cobrar IPTU de aeroportos

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Prefeituras e câmaras de vereadores começam a se movimentar para cobrar IPTU das concessionárias de aeroportos, que tinham isenção.

A mudança é mais uma dor de cabeça para estas empresas, que ainda discutem com o governo federal um novo cronograma de pagamento de outorgas e pedem para rever as condições do contrato.

Na linha de frente, estão a prefeitura de Guarulhos e a Câmara Municipal de Campinas, cidades onde ficam os aeroportos de Guarulhos e Viracopos, respectivamente.

O Rio avalia se fará o mesmo. Caso as iniciativas vinguem, as concessionárias poderão ser garfadas em milhões de reais, o que inevitavelmente levaria a aumento de taxas e preços de serviços aos passageiros, segundo advogados.

O movimento foi despertado por recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, em abril, concluiu dois julgamentos. Num deles, estava em jogo a cobrança de IPTU da Petrobras relativo a uma área que a estatal arrenda da União no Porto de Santos (SP). O STF entendeu que era possível, pois a imunidade tributária assegurada pela Constituição a entes públicos “não se estende a empresa privada arrendatária de imóvel público, quando seja ela exploradora de atividade econômica com fins lucrativos”. Apesar de controlada pelo Estado, a Petrobras tem personalidade jurídica privada. Na avaliação dos ministros, a isenção representaria vantagem econômica para a companhia.
No outro processo, o tribunal entendeu que uma concessionária de veículos que ocupava um terreno da União contíguo ao aeroporto de Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio, tinha de pagar IPTU. Foi fixada a tese de que cabe o pagamento quando “o imóvel de pessoa jurídica de direito público for cedido a pessoa jurídica de direito privado”. Em ambos os processos, as decisões foram consideradas de repercussão geral, ou seja, valem para todos os casos que se enquadrarem nessas situações. Ainda não foi decidido se a cobrança seria retroativa.

Num cenário de crise fiscal, prefeitos e vereadores viram nas decisões do STF uma brecha para elevar a arrecadação. Sobre possíveis projetos de lei para cobrar IPTU de empresas privadas em áreas públicas, a secretaria municipal da Fazenda do Rio disse em nota que “a matéria está sob estudo”. A Procuradoria-Geral do Município disse que “está analisando casos em que se aplica o novo entendimento do STF” sobre o imposto. Segundo a Procuradoria, há 68 ações na Justiça para cobrar o tributo em situações semelhantes às que tiveram aval do Supremo. Considerando essas ações e processos administrativos na Fazenda, o IPTU chegaria a R$ 61 milhões, considerando empresas privadas e sem incluir ativos de infraestrutura.

O secretário da Fazenda de Guarulhos, Peterson Ruan, organizou um grupo de trabalho para estudar a questão e já está em conversas com o aeroporto para negociar a cobrança. Num primeiro momento, ele quer cadastrar todos os estabelecimentos comerciais que operam na área concedida à GRU Airport, empresa que ganhou a concessão do terminal, em 2012. Ruan avalia que o IPTU de áreas ocupadas pelo hotel, pelo estacionamento, por farmácias, restaurantes e lojas deve ser cobrado.

A cobrança seria feita em nome da concessionária, que repassaria os custos às empresas que exploram os pontos comerciais. Os técnicos da Fazenda seguem com os estudos para identificar outras áreas da concessão que poderiam ser tributadas. Considerando todo o terreno do aeroporto e a cobrança retroativa ao início da concessão, as estimativas apontam para algo em torno de R$ 100 milhões, suficiente para pagar a folha mensal dos servidores ativos da cidade de Guarulhos.
— Não se cobrava nada da Infraero porque ela é uma empresa pública. Hoje, o serviço está concedido a uma empresa privada e que obtém lucro — afirma Ruan.

A dívida do município de Guarulhos é da ordem de R$ 7,5 bilhões. Em Campinas, que terminou 2016 com déficit fiscal de R$ 200 milhões, a Câmara Municipal encabeça o movimento para estender a cobrança de IPTU aos concessionários. Tramita na Casa projeto dos vereadores Rafael Zimbaldi (PP) e Marcos Bernardelli (PSDB) que autoriza a incidência do imposto sobre “imóveis públicos ocupados por empresas privadas e de economia mista que exerçam atividade econômica com fins lucrativos”. Na justificativa do projeto, o aeroporto de Viracopos é citado como um dos possíveis alvos de cobrança.
— Essas empresas lucram muito. Por que não podem pagar IPTU para o município ? — indaga Zimbaldi.

O tema é controverso. Bianca Xavier, sócia do setor tributário do Siqueira Castro Advogados, observa que as concessionárias dos aeroportos de Guarulhos e Viracopos, assim como dos demais terminais concedidos, são empresas privadas, mas prestam serviços públicos. Esse é um dos argumentos da Associação das Empresas Administradoras de Aeroportos (Aneaa) para contestar a cobrança. A Aneaa sustenta que o uso do terreno pelo concessionário é temporário e que ele será devolvido à União ao fim da concessão “com expressiva valorização”, devido aos investimentos em expansão e melhorias.

A Aneaa avalia que as concessionárias de aeroportos se enquadram no regime de monopólio, pois “prestam serviços de forma exclusiva” em ambiente regulado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Mais uma razão para que a cobrança de IPTU não se aplique, diz a associação.

Bianca avalia que o argumento do monopólio é questionável, pois pode haver mais aeroportos na cidade. E lembra que a Constituição garante imunidade tributária recíproca a entes públicos, ou seja, União, estados e municípios não podem cobrar tributos entre si. Por isso, uma prefeitura não pode cobrar IPTU de um prédio onde funciona o Ministério do Trabalho, por exemplo. O benefício é estendido a autarquias e fundações. No caso de empresas públicas, decisões do STF asseguram a imunidade quando são prestados serviços públicos em regime de monopólio. Caso de Correios, Casa da Moeda e Infraero.
— Elas prestam serviços públicos que seriam onerados com a cobrança de impostos. No fim, os cidadãos seriam onerados, por meio de aumento de taxas, o que fere o princípio que embasou a decisão de estender a imunidade tributária a empresas públicas. Os Correios têm isenção de tributos para que as pessoas não paguem caro pelo serviço. A área dos aeroportos é tão grande que o valor do IPTU poderia inviabilizar o negócio — diz Bianca.

Segundo a Aeroportos Brasil, que detém a concessão do terminal de Campinas, a área do aeroporto será de 25 km², após conclusão das desapropriações. A área de Guarulhos é de 11,9 km². As duas concessionárias endossam a posição da Aneaa. Em nota, Viracopos diz que “independentemente do fato de o aeroporto estar localizado em área pública da União, a atividade por ele exercida se trata de uma concessão de serviços públicos”. Já a GRU afirma que “recebeu o imóvel para prestação de serviço público e que o mesmo é bem público de propriedade da União”.

Em tese, empresas que detêm concessões de serviços de outra natureza, como terminais portuários, também poderiam entrar na briga com prefeituras dispostas a cobrar IPTU delas. O secretário de Finanças de Campinas, Tarcísio Cintra, reconhece que a discussão será longa. Possivelmente haveria pedidos de reequilíbrio financeiro de contratos, pois a cobrança não está prevista no edital das licitações. Hoje, há cerca de R$ 2 bilhões em pedidos de reequilíbrio feitos por aeroportos privados em análise na Anac. Ainda assim, o secretário vê brecha para a cobrança:
— Há serviços prestados dentro dos aeroportos que não são serviços públicos nem são monopolistas, como hotéis, estacionamentos e praça de alimentação.
Para Roberto Junqueira Ribeiro, sócio da DGCGT Advogados, seria possível identificar essas áreas para cobrar IPTU apenas sobre elas e não sobre aquelas onde se desenvolvem os serviço públicos, como pistas e pátio. Bianca, da Siqueira Castro, explica que isso é feito em consulados, que contam com cafés ou restaurantes.

Há imunidade tributária só das áreas onde são realizados serviços consulares. Ribeiro avalia, porém, que a medida seria de difícil operacionalização nos aeroportos :
— Poderia ser feita uma cobrança fracionada. Mas o cadastro teria que ser atualizado constantemente.

Fonte : O Globo

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